=== LOUCURA E SANIDADE ===
Luis Gustavo da Silva Joaquim
Há
bastante tempo tenho pensado sobre a tenuidade entre loucura e sanidade. Isso,
claro, tem um contexto. Gosto bastante do período literário e artístico do
século passado; sobretudo no que diz respeito à pintura e poesia modernas. Por
isso, estive revisitando aspectos da brilhante “Semana de Arte Moderna”, de
1922.
Olho,
por exemplo, a belíssima pintura de óleo sobre a tela composta por Vincent van
Gogh, chamada “A noite estrelada” e datada de 1889:
Trata-se
da vista da janela de seu quarto do hospício que habitava por livre vontade. Na
obra, o autor expressa o mundo, por meio de sua visão, com pinceladas fortes e
onduladas, dando a impressão de movimento e vida. A vila, que aparece no
quadro, dizem que não fazia parte da vista real da janela, mas era uma memória
do bairro onde o autor cresceu. Ora, aqui, penso: como a mistura de memória e
realidade nos faz criar fantasmas interiores. Como podemos acreditar em
mentiras que criamos em nossa mente? Até que ponto essas mentiras se
(con)fundem com a verdade da vida?
Ademais,
os pontos de luz nas casas remetem às estrelas no céu, criando um diálogo entre
a humanidade e a grandeza da via láctea. É a profundidade da existência, da
vida, do mundo, das coisas, do Absoluto! Veja como somos seres mínimos em
relação a tudo isso. E aí, conscientes disso, pergunto: por que somos tão
arrogantes, orgulhosos e intolerantes?
Há
ainda muito mais aspectos da obra que pode ser refletido, e por isso, fico
pensando: como pode um homem dito com pouca sanidade mental expressar,
artisticamente, algo tão profundo existencialmente? Ora, daí surge a indagação
que intitulo este escrito; seria loucura ou sanidade? Será que, como dizia
Charles Brown Jr, “só os loucos sabem”? Afinal de contas, o que é
verdadeiramente existir? Recordo-me de um adágio que ouvia frequentemente em
minha infância que dizia “às vezes é preciso se fingir de louco para viver
bem”. Ou ainda, o quanto de loucura todos nós temos e qual o limite para que
esta porção não se torne insanidade? Verdadeiramente, são questões difíceis de
responder objetivamente.
A
arte faz isso com a gente: tem esse grande poder de nos transportar para dentro
de nós mesmos, no mais profundo daquilo que somos a fim de nos perguntarmos
coisas que talvez nem tenhamos respostas.
O
belo, estudado filosoficamente na disciplina de Estética, nos garante que o
homem não se satisfaz apenas produzindo aquilo que lhe é útil, e por isso,
produz também o que lhe agrade sensitivamente. Para Schopenhauer, por exemplo,
a arte é vital para a humanidade. Portanto, ela comporta um verdadeiro
encontro daquilo que há de subjetivo no artista com a subjetividade de quem
aprecia. Não raro, a definição clássica do belo consiste não em uma
conceituação sistemática, mas na experiência de contemplação da própria obra
artística.
Voltando
para a questão do quadro de van Gogh, é tanta profundidade que quaisquer
palavras se tornam insuficientes para expressar os sentimentos que despertam em
quem o vê; mas uma coisa é certa: algum sentimento causa... quer sejamos nós mais ou
menos sensíveis à arte, ao belo, à existência, mas alguma coisa sentimos. Isso
porque faz parte de nós essa busca de identificação, de respostas... Seríamos
loucos por questionar a vida ou justamente isso nos faz saudáveis? Não sei. O
fato é que “uma vida que não é examinada não vale a pena ser vivida”, como se
atribui a Sócrates.
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